O mar é um lugar que traz muito deslumbramento e muitos temores. O mesmo pode-se dizer das criaturas marinhas que ele abriga, animais que encantam ao mesmo tempo que podem nos assustar com seu tamanho. É o caso das baleias, criaturas dóceis porém com proporções titânicas que causariam medo a maior parte das pessoas que tivessem contato próximo a elas.

Porém quando se fala em criaturas gigantes marinhas, não é sobre seres mitológicos como o Kraken ou o Leviatã, mas sim criaturas cujos nomes são bem conhecidos como as já citadas baleias, os golfinhos, botos, várias espécies de tubarões, lulas-gigantes, etc. Para ilustrar, as baleias azuis – que já não são nem as maiores criaturas que a humanidade tem conhecimento hoje – chegam a medir até 30 metros de comprimento. Já o golfinho-nariz-de-garrafa alcança um pouco mais dos 3,5 metros, o que pode não parecer muito em comparação às baleias, mas já é o dobro do tamanho médio de um ser humano.

Recentemente, pesquisadores brasileiros parece ter encontrado a explicação genética para o tamanho colossal dessas criaturas durante um estudo sobre a sequência de DNA. O grupo faz parte do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (IB/UNICAMP) que publicou um artigo no final do ano passado na revista BMC Ecology and Evolution. Interessados no estudo podem conferi-lo aqui.

O que o DNA revela sobre essas criaturas gigantes marinhas?

Felipe Silva, geneticista e autor principal do artigo científico, e seus colegas pesquisadores investigaram uma sequência de DNA que precede a região de um gene, a região promotora, que é responsável por codificar proteínas. Eles olhavam para uma subunidade específica, o gene NCAPG, nos cetáceos que os levaram às suas importantes descobertas. Os pesquisadores identificaram que essa sequência também pode desempenhar algum papel no controle de proliferação de células em animais cujos corpos se adaptam para crescimentos massivos.

Aqui é importante frisar que os cetáceos, uma ordem de animais mamíferos aquáticos, se dividem atualmente entre dois grupos.

O tamanho médio adulto, em metros, de todas as espécies de cetáceos incluídas. Imagem: BMC Ecology and Evolution

Os primeiros são os misticetos, que em outras palavras são as baleias sem dentes como as jubartes, baleias-azuis e baleias-francas. O segundo grupo são os odontocetos, ou seja, aquelas baleias que possuem dentes como as cachalotes e também os golfinhos como as orcas. Mas com seu estudo os pesquisadores brasileiros talvez tenham descoberto uma nova divisão.

Segundo Felipe Silva, eles encontraram no NCAPG uma divisão entre os animais com mais de 10 metros de comprimento e os de menos, o que separaria os gigantes dos não-gigantes. Esses resultados se alinham com achados de pesquisas anteriores onde outros o gene supostamente teria se favorecido pela evolução dos cetáceos gigantes. Portanto, isso indicaria que ambos o NCAPG e a região promotora são fundamentais para os cetáceos atingirem tamanhos tão grandes.

 “Nossas descobertas não alteram a árvore evolutiva do grupo, mas constituem novas evidências de que o tamanho gigante tem uma base genômica”, diz a geneticista Mariana Nery do IB/UNICAMP que também contribuiu no estudo.

Descoberta dos cientistas brasileiros também pode ajudar em pesquisas sobre câncer

Outra surpresa que os geneticistas do IB/UNICAMP se depararam é que talvez a sequência genética dessas criaturas gigantes marinhas também possam ajudar nos avanços de pesquisas sobre câncer. Isso porque animais que possuem um grande número de células estão mais suscetíveis a tumores. Porém, ao contrário das expectativas, a incidência de câncer observada em cetáceos é baixa.

Portanto, os pesquisadores analisaram as regiões regulatórias de quatro outros genes que já tiveram suas sequências codificadoras de proteínas estudadas. Eles especulam que tais regiões podem afetar não somente o tamanho dos cetáceos como também melhorar sua capacidade de reduzir as taxas de câncer.

Como Nery explica, humanos também possuem esses genes. Logo isso serve de incentivo para também estudar como eles podem ajudar a suprimir a formação de tumores cancerígenos e, caso seja confirmada essa possibilidade, há potencial para ampliar os futuros tratamentos de câncer através do genoma humano.