Você sabia que existem pessoas que têm dificuldade em identificar a expressão facial das emoções? Este problema tem origem numa alteração da dopamina e surge num sector muito específico da população.
O que seria da nossa espécie se fôssemos incapazes de reconhecer as nossas próprias emoções e as dos outros? Nos tornaríamos uma população fria e robótica, com poucas chances de sobrevivência. As emoções são a nossa cola social, elas bombeiam tudo o que somos e atuam como aqueles estados psicofísicos que modulam tudo, desde a conexão social até a motivação e o aprendizado.
Portanto, pensar que entre nós existem pessoas incapazes de fazer uma identificação adequada delas pode nos surpreender. Estados como medo, raiva ou tristeza impulsionam a ação e também a reação. Todos precisamos ter familiares, amigos e parceiros que saibam reconhecer em nós o que sentimos.. Faltar algo assim é sinônimo de sofrimento.
No entanto, há mais homens e mulheres do que pensamos que apresentam este défice, este problema que é tão disfuncional quanto triste. E não, não estamos falando de indivíduos que orbitam transtornos de personalidade como a psicopatia. Existem doenças que provocam uma alteração da dopamina, o que acaba alterando a capacidade de reconhecer emoções no rosto dos outros.
As expressões faciais das emoções básicas são fáceis de rotular, é algo que aprendemos desde pequenos e que facilita a empatia. Porém, em algum momento, podemos perder essa capacidade devido a certos distúrbios e doenças.
Dificuldade em reconhecer emoções faciais: por que isso acontece?
O reconhecimento de emoções é uma habilidade que aprendemos desde cedo. Somos leitores naturais de padrões complexos. Dimensões como a empatia e a nossa própria experiência na ligação com as pessoas tornam mais fácil detectar humores, emoções, necessidades e até preocupações na expressão facial dos outros.
A investigação da Ruhr University Bochum destaca algo interessante. As pessoas identificam emoções nos outros não apenas pelas nossas experiências anteriores, mas também pelo contexto em que nos encontramos. Existem dezenas de sinais físicos e até ambientais que facilitam essa habilidade tão necessária ao ser humano.
Saber o que acontece com os outros nos fornece informações decisivas para a nossa sobrevivência e a dos outros. É assim que se constroem vínculos, como agimos diante dos perigos e também regulamos nosso comportamento. Amor, cuidado, altruísmo e compaixão exigem o reconhecimento de emoções faciais. Porém, há quem possa perder essa capacidade.
A dopamina não é apenas o neurotransmissor que impulsiona a motivação, a aprendizagem e o bem-estar. Este hormônio é essencial para promover o reconhecimento das emoções.
Deficiência de dopamina e doença de Parkinson
Pessoas com Parkinson apresentam, em média, uma limitação na hora de identificar os estados emocionais dos outros. A Universidade de Birmingham realizou um interessante investigação em 2022 em que esse aspecto foi evidenciado. Quando os níveis deste neurotransmissor estão baixos, as pessoas têm dificuldade em saber o que a sua família, amigos, etc.
Esta doença neurodegenerativa tem origem na destruição progressiva de neurônios que produzem dopamina na substância negra do cérebro. Isso resulta em distúrbios de movimento, problemas de equilíbrio, perda de olfato, rigidez corporal, etc.
Agora, outra característica que ocorre com o Parkinson é a redução das próprias expressões faciais e uma limitação no reconhecimento das emoções dos outros. Isso afeta a qualidade de suas interações. A incapacidade de expressar seus sentimentos com o rosto e de identificá-los nas pessoas ao seu redor é muitas vezes vivenciada com grande dificuldade. A origem deste quadro sintomatológico reside num baixo nível deste neurotransmissor polivalente.
Esquizofrenia, outra doença com dificuldade de reconhecimento de emoções
Uma das doenças mais devastadoras é a esquizofrenia. Não há cura e está rodeada de um grande estigma social. O único fato positivo é que conhecemos cada vez mais dados sobre esta condição psiquiátrica. Por exemplo, a Universidade Johns Hopkins, em Baltimore, publicou um estudar há alguns meses, em que nos forneceu novos dados.
Pacientes com esquizofrenia apresentam um acúmulo incomum de dopamina no núcleo caudado do corpo estriado. Tudo isso se deve a uma alteração nos autorreceptores D2, que deixam de regular seu fluxo. Isso se traduz em sintomas semelhantes aos da depressão: falta de motivação, achatamento emocional, desesperança, anedonia, etc.
Além disso, Pessoas com esquizofrenia, assim como aquelas com Parkinson, apresentam graves alterações no reconhecimento das emoções faciais.. Não identificam quem sofre, sente preocupação, angústia ou felicidade. Isso nos mostra que qualquer alteração nos níveis de dopamina (déficits ou excessos) se traduz em limitações na identificação de sentimentos nos outros.
Quando o cérebro sofre déficits em nossas habilidades emocionais, a vida social é afetada.
Existe algum tratamento?
Problemas em reconhecer emoções são um efeito colateral de algumas doenças neurológicas. É um sintoma de uma doença subjacente que, embora possa ser tratada, não tem cura. Nesse caso, tanto o Parkinson quanto a esquizofrenia possuem medicamentos que podem regular a liberação de dopamina.
No caso da esquizofrenia temos os medicamentos neurolépticos, enquanto no Parkinson temos os agonistas da dopamina como a clássica levodopa. Agora, a Dra. Bianca Schuster, autora do referido trabalho publicado no Journal of Neuroscience, Ele apontou algo interessante.
Verificou-se que a administração de haloperidol nestes dois grupos de pacientes melhora o reconhecimento emocional. Neste momento, as causas deste resultado positivo não são claras e é necessária mais investigação. Porém, embora existam medicamentos que promovam efeito positivo, precisamos desenvolver tratamentos mais eficazes, duradouros e sem efeitos colaterais.
Todo distúrbio e condição neurológica é um drama de dimensões imensuráveis que limita a qualidade de vida da pessoa em infinitas áreas de sua vida. Esperamos que num futuro próximo tenhamos tratamentos abrangentes que revertam e curem realidades tão graves e de tamanho impacto social.
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- Revista de Neurociências