Alguns pesquisadores estão chamado de “protetores do gelo” os vírus gigantes recém descobertos no manto de gelo da Groenlândia. Embora pareçam personagens saídos da ficção científica, esses organismos parecem estar ajudando a mitigar os efeitos das mudanças climáticas.
Derretimento acelerado do gelo
A cada renascimento da primavera no Ártico, um espetáculo fascinante se desenrola. Após um longo período de escuridão, o sol emerge no horizonte, anunciando o retorno da vida.
Os imponentes ursos polares, que durante meses se refugiaram em suas tocas de inverno, agora emergem para explorar o recém-descongelado território. Enquanto isso, a graciosa andorinha-do-mar do Ártico retorna de sua épica jornada ao sul, e os majestosos bois almiscarados empreendem sua migração rumo ao norte, seguindo os chamados ancestrais da primavera.
Porém, não são apenas os animais que despertam sob a luz revitalizante do sol. As algas, adormecidas nas profundezas do gelo, começam a florescer, tingindo vastas extensões de branco com suas vibrantes cores. Este fenômeno marca não apenas uma transformação estética, mas também um impacto significativo no ambiente ártico.
Com o florescimento das algas, o gelo assume uma tonalidade mais escura, diminuindo sua capacidade de refletir os raios solares. Esse processo, por sua vez, acelera o derretimento do gelo, contribuindo para o já preocupante fenômeno do aquecimento global.
Supergrupo de vírus
Há indícios de que os cientistas possam ter desvendado uma possível solução para moderar o crescimento das algas do gelo – uma descoberta que poderia, em última análise, desacelerar o processo de derretimento do gelo em algumas regiões.
Em uma expedição pelo gelo, Laura Perini, uma pós-doutoranda do Departamento de Ciências Ambientais da Universidade de Aarhus, junto com seus colegas, fez uma descoberta intrigante: vírus gigantes.
A teoria sugere que esses vírus, encontrados coabitando com as algas da neve, possam se alimentar delas, agindo como um mecanismo natural para regular a proliferação das algas.
Desse modo, esses vírus pertencem ao supergrupo conhecido como vírus de DNA nucleocitoplasmático grande (NCLDV), classificado no filo Nucleocytoviricota. Apesar de seu nome sugestivo, a designação “gigantes” é relativa, já que esses vírus não são visíveis a olho nu, mas são consideravelmente maiores do que a maioria das bactérias, com aproximadamente 2,5 micrômetros de comprimento. Em termos comparativos, isso os torna cerca de 125 vezes maiores do que um vírus comum.
No entanto, a caracterização desses vírus como “gigantes” não se limita apenas ao seu tamanho físico. Eles também apresentam um genoma considerável, com cerca de 2,5 milhões de letras, contrastando fortemente com as bactérias, que geralmente possuem entre 150.000 e 200.000 letras em seu genoma.
Aquecimento rápido do Ártico
A compreensão desse vírus gigante e sua capacidade de combater as algas emerge em um momento de grande importância, pois evidências alarmantes indicam que o Ártico está aquecendo a uma taxa quatro vezes mais rápida do que outras regiões do globo.
Atualmente, a equipe liderada por Perini está empenhada em desvendar os mistérios desses vírus gigantes, buscando compreender plenamente o papel que desempenham em seu habitat gélido, um ambiente surpreendentemente rico em biodiversidade apesar de sua aparente aridez.
Perini explica em comunicado que “Não sabemos muito sobre os vírus, mas acho que eles podem ser úteis como forma de aliviar o derretimento do gelo causado pela proliferação de algas […] Ainda não sabemos quão específicos eles são e quão eficientes seriam. Mas, ao explorá-los mais detalhadamente, esperamos responder a algumas dessas questões […] Continuamos estudando os vírus gigantes para saber mais sobre suas interações e qual é exatamente o seu papel no ecossistema. Ainda este ano, lançaremos outro artigo científico com mais algumas informações sobre vírus gigantes que infectam uma microalga cultivada que prospera na superfície do gelo do manto de gelo da Groenlândia.”