Para Albert Camus, escritor e filósofo franco-argelino, “só existe um problema filosófico realmente sério: o suicídio.” Esse tema perpassa, seja individual ou coletivamente, toda a sociedade. Nesse contexto, um novo estudo liderado pela professora de psicologia da Universidade de Alberta [no Canadá], Rebecca Purc-Stephenson, explorou os fatores de risco que tornam os agricultores mais suscetíveis ao suicídio do que trabalhadores de outras profissões.
A pesquisa vai além: ela revela quais são os fatores únicos que estão diretamente ligados, em última instância, ao fato desses trabalhadores tirarem a própria vida, mas também aborda alternativas para protegê-los de modo que os ajudem a desenvolver uma maior resiliência diante daquilo que enfrentam.
Agricultores são mais vulneráveis ao suicídio
A agricultura é marcada pelo estresse ocupacional contínuo que coloca os trabalhadores envolvidos num risco bastante elevado de suicídio, como sugere o estudo desenvolvido por pesquisadores da Universidade de Alberta.
A pesquisa, primeira a explorar dados de entrevistas coletados de vários estudos sobre agricultores e suicídio, revela quais são os estressores únicos enfrentados pelos agricultores. Os resultados da pesquisa levantam questões deveras alarmantes, visto que os agricultores morrem por suicídio em taxas maiores do que outros trabalhadores. Cerca de 225 milhões de profissionais da área não têm uma boa saúde mental.
Purc-Stephenson diz que “Queríamos compreender melhor as circunstâncias de vida que os agricultores vivenciaram e que os levaram ao suicídio […] A agricultura é um estilo de vida, não apenas um trabalho, o que torna a cultura agrícola única. É importante entender as particularidades desse grupo.”
Fatores de risco
Lidar com a agricultura é um desafio, já que os meios de vida dos agricultores podem ser afetados por diferentes problemas, como mudanças climáticas, doenças em plantas ou animais, custos operacionais em alta e outros desafios complexos. Estudos do Canadá, Estados Unidos e Austrália indicam que essa profissão está associada a uma taxa de suicídio mais elevada em comparação com outros empregos.
Na pesquisa supracitada, foram analisados 14 estudos científicos de diversos países, incluindo Canadá, Estados Unidos, Reino Unido, Austrália e Índia. Os estudos continham informações fornecidas por parceiros de agricultores, familiares e pessoas próximas que estiveram em contato com eles antes de suas mortes.
A análise revelou sete fatores específicos relacionados ao suicídio entre agricultores, destacando dois como especialmente influentes: a manutenção da identidade como agricultor e a experiência de uma crise financeira significativa.
A ligação da pessoa com seu estilo de vida tem se mostrado como um fator de risco importante, uma vez que “Eles [os agricultores] não conseguiam imaginar-se em qualquer outra função e, combinada com uma crise financeira, simplesmente não viam uma saída”, como aponta Purc-Stephenson.
A dinâmica comunitária também é um fator de risco para o suicídio entre agricultores na medida em que não dá privacidade. Embora seja positiva quando oferece apoio social, a comunidade pode julgar as decisões dos outros e essa pressão que advém desse convívio representa uma ameaça à saúde mental dos agricultores já fragilizados.
Adicionado a esses fatores, o distanciamento emocional, social e geográfico, a habilidade de lidar com eventos imprevisíveis, como desastres climáticos ou problemas com animais, além do fácil acesso a produtos químicos agrícolas prejudiciais e armas de fogo, foram outros fatores importantes que influenciou o suicídio entre agricultores.
Estrutura FARM para reduzir taxas de suicídio entre agricultores
Tendo como base os fatores de risco para suicídio entre agricultores descobertos no estudo, os pesquisadores desenvolveram uma ferramenta chamada estrutura Farming Adversity-Resilience Management (FARM).
O modelo FARM aborda como a cultura agrícola, as causas particulares da vida profissional e a saúde mental se relacionam para contribuir potencialmente para o suicídio desse grupo.
Purc-Stephenson explica que “Esta será uma ferramenta para a medicina de precisão, que pode ser usada por investigadores, terapeutas de saúde mental, médicos e outros profissionais de saúde para ajudar a compreender o que os agricultores vivenciam e o que os coloca em risco.”
Outras políticas adotadas também podem contribuir para diminuir as taxas de suicídio entre agricultores, como programas recreativos, seguro agrícola subsidiado, discussões sobre a importância em cuidar da saúde mental e o aconselhamento adaptado às necessidades dos agricultores.