O jornalista James Vlahos estava escrevendo sobre chatbots quando seu pai foi diagnosticado com câncer em 2016. Ele teve uma ideia: transformar seu pai em um chatbot usando ferramentas de uma empresa chamada PullString. Vlahos passou semanas entrevistando seu pai e transformando as conversas em um bot interativo por meio de um processo minucioso.

Quando sua mãe testou a aplicação – o Dadbot – ficou impressionada, e seu pai também gostou da ideia. Após a morte de seu pai, Vlahos escreveu sobre a experiência, o que gerou grande interesse de pessoas querendo bots de seus próprios familiares. Isso o inspirou a fundar a HereAfter AI, uma startup de inteligência artificial, que agora tem muitos clientes e que pode nos aproximar da imortalidade.

HereAfter AI e questões subjetivas

Para muitos, a ideia de conversar com uma versão simulada de um ente querido falecido pode ser perturbadora. No entanto, Vlahos, o criador do HereAfter AI, não vê razão para alarme nessas criações.

Ele enxerga o serviço oferecido pela sua empresa como uma evolução natural na preservação das memórias, algo semelhante a guardar uma última mensagem de voz valiosa. Contudo, com várias outras empresas surgindo recentemente, cada uma oferecendo serviços similares em diferentes níveis de realismo e interatividade, é legítimo questionar se essas simulações artificiais poderiam ter consequências imprevistas.

Será que elas poderiam prolongar o processo de luto ou misturar as fronteiras entre vida e morte de uma maneira totalmente nova? Com a crescente inteligência artificial e a falta de limitações éticas, é até possível imaginar se essas criações não poderiam nos proporcionar uma espécie de imortalidade – e compreensões diferentes a respeito do conceito.

StoryFile

O StoryFile é outra aplicação que pode nos tornar imortais. Stephen Smith, historiador oral que documenta as histórias dos sobreviventes do Holocausto construiu um software que poderia gravar vídeo de um contador de histórias e transformá-lo em um holograma interativo.

Um dos primeiros relatos que ele registrou foi o de Aaron Elster, um sobrevivente do Holocausto que viveu escondido em um sótão durante a Segunda Guerra Mundial para escapar da perseguição dos nazistas.

Após o falecimento de Elster em 2018, Smith dedicou um dia inteiro a interagir com o avatar de Elster, fazendo-lhe perguntas e absorvendo sua sabedoria. Essa experiência foi muito mais marcante do que simplesmente assistir a uma entrevista em vídeo.

O software processava as perguntas de Smith e buscava trechos relevantes da entrevista original de Elster para oferecer respostas. Ao encontrar palavras ou temas semelhantes, o software reproduzia o vídeo correspondente como resposta.

Embora não fosse o mesmo que conversar com alguém vivo, essa interação foi suficiente para convencer Smith de que tecnologias como o StoryFile teriam um impacto significativo na maneira como preservamos nossas histórias para as futuras gerações.

Um dos clientes proeminentes do StoryFile é a família Walton, conhecida por fundar o Walmart. Eles encomendaram um StoryFile para Sam Walton, o fundador da empresa, que faleceu em 1992.

Para isso, a empresa extraiu discursos e diários dos arquivos da família, contratou um ator para recitar trechos desses textos e utilizou a tecnologia deepfake para criar uma representação visual e auditiva de Walton, tornando o holograma de vídeo em tamanho real extremamente realista. O resultado foi tão convincente que o holograma foi até mesmo exibido no Museu do Walmart.

Holograma de Sam Walton que fica no Museu Walmart em Bentonville, Arkansas. Imagem: AP

Fac-símiles de falecidos

Enquanto empresas fundadas por jornalistas e historiadores têm uma abordagem familiar ao registrar os pensamentos das pessoas para as gerações futuras, os avanços na tecnologia e inteligência artificial estão introduzindo mudanças radicais no cenário.

Semanalmente, novidades surgem, ampliando as possibilidades neste campo em todas as direções. Com o aumento do poder de processamento, a criação de vídeos deepfake e o desenvolvimento de grandes modelos de linguagem, como o ChatGPT, surge a possibilidade de criar representações híbridas entre humanos e computadores de indivíduos falecidos.

Evidentemente, essas representações podem apresentar características desconcertantes e, certamente, levantar questões éticas significativas. Por outro lado, as tecnologias futuras nessa área podem se tornar massivamente aceitas, mudando os paradigmas da morte.