Quando o Titanic afundou, seu naufrágio foi noticiado no mundo inteiro, e até hoje ele permanece na memória de muitas pessoas devido a filmes, documentários e recentes acontecimentos. Mas, quando um navio com alemães foi atacado durante a Segunda Guerra Mundial, acabando com a vida de diversos civis, o fato foi deixado totalmente de lado.
O ano era 1945 e a Alemanha já estava ficando para trás na guerra com a União Soviética avançando na frente oriental. A essa altura, a população alemã já era aterrorizada com histórias de estupro e assassinato provocados pelas forças soviéticas mais vingativas. Isso fez com que a população decidisse cada vez mais abandonar o Exército Vermelho.
Nesse cenário, a Prússia Oriental testemunhou o que os alemães chamariam mais tarde como Operação Hannibal, um esforço maciço de evacuar civis, soldados e equipamentos do local para um ambiente mais seguro através do Mar Báltico. Para realizar essa travessia, eles contavam com um antigo transatlântico de luxo, chamado Wilhelm Gustloff.
No entanto, a marinha soviética estava à espera de qualquer transporte que cruzasse seu caminho. Quando o navio com alemães foi avistado, o destino de aproximadamente 9.000 dos 10.000 passageiros da embarcação seria a morte, número que supera o desastre do Titanic. Porém, a memória dos mortos e os relatos dos sobreviventes ficaram esquecidos por muito tempo.
O transatlântico Wilhelm Gustloff de 25.000 toneladas, havia sido criado para ser um navio de férias, um local “para dar luxo oceânico aos nazistas”, como observou a Associated Press em 1937.
O navio foi nomeado em homenagem a um líder nazista suíço que tinha sido assassinado por um estudante de medicina judeu no ano anterior. No funeral de Gustloff, Adolf Hitler estava presente e disse que ele estaria “nas fileiras dos mártires imortais de nossa nação”.
No entanto, quando a guerra começou, o navio de férias logo foi usado como um quartel. Antes de ser utilizado para evacuar os alemães, ele não havia sido usado no oceano por anos.
O desastre em alto mar
Durante o embarque da população, as autoridades verificaram suas passagens. Mas conforme o caos foi surgindo e os alemães entraram em pânico, as pessoas começaram a entrar desesperadamente no navio.
Isso fez com que o número exato de passageiros a bordo não fosse totalmente conhecido. O que se sabia era que o navio havia sido construído com capacidade para 2.000 pessoas, mas que, ao sair do porto, carregava bem mais.
Após o embarque, os oficiais superiores do navio com alemães estavam com muitas dúvidas sobre como prosseguir essa viagem. Eles tinham como opção navegar pelas águas rasas e cheias de minas, ou então pelas águas profundas e infestadas de submarinos.
Além do mar, o clima da época não ajudava. Era inverno, e a neve e o granizo conspiravam para adoecer a tripulação e os passageiros. O capitão Paul Vollrath, que serviu como segundo oficial sênior, relatou mais tarde que na época não existiam navios de escolta adequados para levar os alemães.
Depois de escurecer, as luzes de navegação foram acesas, o que aumentou a visibilidade do navio com alemães. Isso fez com que um submarino soviético S-13 que estava nas proximidades, visse o Wilhelm Gustloff. O submarino estava sob o comando de Alexander Marinesko, que na época precisava de um impulso na sua reputação. Ele viu no navio uma oportunidade para realizar tal feito.
Como o navio era um alvo fácil, Alexander enviou torpedos que atingiram o transatlântico durante uma hora até o navio afundar no mar. O S-13 lançou três torpedos que afetaram os alojamentos da tripulação, a área da piscina e as salas de máquinas e conveses inferiores.
O navio com alemães tinha muitas pessoas para os poucos botes salva-vidas, sendo necessário chamar mais ajuda. Mas, para piorar a situação, quando os barcos de resgates alemães chegaram ao local, eles tiveram que deixar muitas pessoas para trás enquanto ainda estavam em plena capacidade para não serem atacados pelos soviéticos.
Na manhã seguinte, as águas ao redor do navio estavam cheias de corpos, muitos deles com crianças utilizando coletes salva-vidas que as faziam flutuar. Dentro desse cemitério no oceano, somente uma criança, um bebê enrolado em cobertores a bordo de um bote salva-vidas cercado por passageiros falecidos, conseguiu sobreviver e foi adotado pelo oficial que o encontrou.
De todos os passageiros que haviam embarcado no navio com esperanças de encontrar um lugar mais seguro, somente 1.000 conseguiram sobreviver.
O motivo do desastre não ter sido muito noticiado
Por mais que a tragédia tenha sido grande, ela recebeu pouca atenção na época. Durante os meses finais da guerra, nenhuma das partes envolvidas recebeu incentivos para noticiar a morte de tantos civis.
Na época, estavam ocorrendo muitas mortes em todo o continente europeu, e havia um estigma grande em falar sobre qualquer tipo de sofrimento que os alemães poderiam estar passando depois de tudo que eles fizeram no continente.
Além do Gustloff, outros navios com alemães também afundaram no mar e mataram centenas de pessoas. Mas, considerando o sentimento público da época nos países dos Aliados, o sofrimento alemão não despertava sua simpatia.
Segundo Vollrath, capitão sobrevivente do navio com alemães, o Wilhelm Gustloff “arrastou amor, esperança e desejos para o fundo do mar”.